Entrevista com a Artista Plástica Carmem Paixão




Léo Lima: De onde você é?

Carmem Paixão: Eu moro no Rio da Prata (sub-bairro de Campo Grande) cidade do Rio de Janeiro.

LL: Qual é o tipo de arte que você faz?

CP: Eu trabalho com pintura e faço umas esculturas de papel, meu trabalho retrata meu bairro, as coisas que eu vivo, me interesso muito por tudo que diz respeito ao meu bairro (Rio da Prata) então, o visual daqui é muito lindo, então aquilo foi entrando em mim, as cores do Rio da Prata, a beleza e os monumentos que têm aqui e são poucos, mas são de grande valor para o local.

LL: O que é pra você ser um artista autêntico? Somos autênticos no fazer a arte ou somos somente a cópia da cópia?

CP: Bom, partindo da idéia do autêntico ser algo que ninguém faz, que só uma pessoa faz ou  poucas pessoas fazem... Eu me considero uma pessoa autêntica no que eu faço... porque meu trabalho é meu, eu não conheço pessoas que tenham o mesmo traço na pintura do que eu.
Posso ter temas parecidos, porque os temas estão ai para todos, o traço que eu tenho é meu. Enquanto as esculturas,  eu acho que por enquanto só eu tenho retratado meu bairro, eu não conheço ninguém aqui de perto que tem retratado meu bairro nesta forma. Porque meu trabalho é feito de papel, ele não é um trabalho igual de gesso, massa... então eu acho que sou autêntica no que faço.

LL: Quando é que começou o interesse pelo que você faz? Quais os artistas que te influenciaram e os que te influenciam hoje?

CP: Ainda um bom tempo atrás, ainda bem criança, ouvi falar na semana de 1922 (Semana de Arte Moderna) e eu vi (as obras) Tarsila do Amaral, eu vi Lasar Segall, eu vi coisas que foram mexendo comigo, eu vi Portinari, então eu fui me apaixonando, aquilo foi entrando em mim.
E eu ainda bem menina e minha família grande, eu tinha um irmão, já falecido, ele era artista! Ele era O Artista!   E acho que assim, primeiro os nomes... Porque a gente vê nomes famosos, quadros famosos, Tarsila do Amaral foi minha primeira referência, mas a influência mesmo veio do meu irmão... Assim, até hoje eu ainda me sinto influenciada por ele.
Hoje nós temos grandes nomes na pintura, mas esta referencia que tenho, esta influência que tenho do meu irmão não sai não... é isto ai!

LL: Qual é a maior desmotivação que um artista pode ouvir?

CP: Ah...eu me sinto desmotivada quando eu não consigo me inserir num grupo de artistas, em que todos fazem um trabalho parecido e eu chego com minha proposta, e geralmente há uma crítica, há um montão de perguntas, perguntando: Que escola? Onde? Quem? Quem foi meu professor? e tal... Estas perguntas me desmotivam, mas eu vou em frente, é só naquele momento, mas depois passa... Mas eu me sinto muito desmotivada quando não me sinto inserida no grupo, um grupo em que todos são artistas, todos são artistas! Independente do que fazem ou não... Não precisa ser todo mundo igual, mas cada um tem que ter sua proposta, seu traço, mas quando há muitos questionamentos isso me desmotiva.

LL: Como você vê a cultura em seu bairro?

CP: A cultura no meu bairro... Eu vejo algo assim... Ainda está muito seletiva, é um grupo restrito, a grande maioria não tem acesso, não tem esta percepção do que é cultura, das coisas que se tem a mão, que se podem fazer as pessoas ainda estão muito preocupadas com seu dia a dia não percebe muito isto... Mas tem um grupo ai que tem feito alguma coisa.
Acho assim: poderia ser melhor, mas ainda é muito seleto o povo que faz uso da cultura que se tem aqui. Eu vejo meu bairro assim, eu enxergo meu bairro como um referencial,  referencial da minha própria vida, eu nasci aqui e pra mim tudo que se planta, tudo se faz aqui passa ser algo de referencia pra mim, então pra mim a cultura aqui no meu bairro é o tudo, é o todo, o todo de Campo Grande e seus sub-bairros.
Eu acho que falta ainda esta percepção do povo em geral, mas pra mim é este ponto, a cultura é o todo do meu bairro, a história, os monumentos, a anatomia do bairro, as montanhas, as cachoeiras é o tudo, tudo que se tem aqui, é isto que eu vejo.

LL: Suas obras foram compradas por pessoas de outros países, como você se sente em sua carreira quando você vê pessoas de outros lugares admirando o que você faz?

CP: Eu me sinto valorizada né, é uma realização, a gente está vendo que é por ai mesmo, que a gente vê que nosso trabalho tem valor, eu vejo assim: que meu trabalho não é qualquer coisa... tem um peso, tem um valor, então quando alguém de fora compra me anima muito mais a continuar.

LL: Se você não fosse artista plástica você faria outra coisa?

CP: Eu não consigo me enxergar sem ser artista, já nasceu assim, já nasceu em mim sabe, quando Deus me fez ele olhou e falou: é.. vai ser artista (risos) eu não consigo,  não consigo imaginar a minha vida sem a arte. Porque tudo que eu vejo , das coisas mais simples,  uma folha de uma arvore, tudo o que eu vejo pra mim é a arte ou se transforma em arte
Então... Eu não consigo me vê sem ser artista, é um sorriso de uma criança, um olhar de tristeza ou alegria, qualquer coisa pra mim, se transforma em arte!
Eu não consigo viver sem arte não, não sei o que faria se não tivesse este dom assim... tão forte em mim a ponto de eu conseguir me expressar para os outros... Acho que morreria!

LL: Hoje, qualquer pessoa pode ser um artista?

CP: Eu acho que o dom ele é nato, é uma coisa que não da pra enganar, agora ele pode ser, percebido pela pessoa ou não, e o artista já nasce artista, o artista de alma o artista de verdade, agora a arte pode ser ensinada sim, pode surgir grandes trabalhos lindíssimos, muito técnicos aprimorados, mas o talento é pessoal, é uma coisa de cada um.
Creio que pode ser formar artistas sim, não artistas de alma... têm pessoas que fazem apenas por lazer por hobby, pra passar o tempo, mas com este sentimento que eu tenho , e que outras pessoas tem, eu acho que é muito pessoal, é algo que transcende, é como viver mesmo... a gente não consegue ficar  sem fazer arte, e tudo que estamos pensando ta girando neste círculo, então é bem fantástico, é incrível não tenho palavras pra expressar...
Complementando o que falei, pode-se ensinar a pessoa a pintar, a esculpir, a representar, a cantar, a tocar um instrumento, mas é diferente do que vem de dentro, é diferente!

LL: Pegando o gancho nesta pergunta anterior, você não acha que existem muitos artistas que estão “mortos” ou adormecidos e que se tivessem acesso a arte ele poderia fazer este artista interior sair? Será que não existem muitas pessoas que estão assim, neste estado apenas precisando de oportunidade pra expor a sua verdadeira paixão artística?

CP: Eu acho que existem sim, muitos artistas “mortos”, adormecidos vamos dizer assim. Pode-se encontrar com esta arte escondida dentro deles, porque as pessoas não percebem aquilo que grita dentro deles a necessidade de fazer alguma coisa que eles ainda não sabem o que é, que de repente, quando se deparar com um tipo de arte (quer seja artes visuais, do teatro, da música...), quando eles se deparam com aquilo eles vão se descobrir...
Então eu penso que tem muita gente ai, a maioria das pessoas tem um “que” escondido dentro de si, que vai fazer a diferença em algum momento, só é preciso ter este encontro, este estalo, esta percepção.

LL: Completando acima, o que você acha da participação dos agentes de ensino das artes (escolas, ONGs, Coletivos e pontos de cultura, Igrejas.), no papel de descobrir e expor estes talentos?


CP: Quanto à arte ser ensinado em escolas e em ONGs, em praças, onde quer que seja eu penso ser super validos, é nesta hora que aparece aqueles que estão adormecidos... Porque não se conhecia no total, quando o ser humano passa a se conhecer e perceber aquela necessidade de fazer aquilo que está guardado, aquilo que está escondido, aquela “ah... eu sinto necessidade de alguma coisa”... é esta coisa que pode ser a arte, eu acho que deve ser ensinado sim, os projetos em torno da arte devem crescer devem surgir em todos os pontos da terra (Brasil), deve se ensinar arte em todo lugar, nas praças, nas escolas, nas igrejas, continuo afirmando é super válido ensinar arte.


Contato com Carmem Paixão: https://www.facebook.com/carmen.paixao.58 


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